O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), perdeu mais uma boa oportunidade de exibir sobriedade, serenidade e temperança, atributos que se espera do Poder Judiciário. Incomodado com o fato de que o ex-presidente Jair Bolsonaro transformou em picadeiro político o quarto da UTI onde está internado após uma cirurgia, o ministro do STF resolveu enviar uma oficial de Justiça para notificá-lo, em pleno leito, sobre a abertura da ação penal no caso de tentativa de golpe de Estado e intimá-lo a apresentar sua defesa.
Foi o suficiente para Bolsonaro dobrar a aposta na performance cênica: durante 11 minutos, enquanto alguém diligentemente filmava a cena, o ex-presidente questionava a oficial de Justiça, cobrando-lhe “ciência de que está dentro de uma sala de UTI”, comparando a atuação da servidora às pessoas que cumpriam ordens da Alemanha nazista e provocando o seu algoz: “Ele acha que me prendendo ou me tirando da vida pública, acabou. Está tudo resolvido a questão do Brasil aqui. E não é assim”.
Como populista que é, e com a proximidade cada vez maior do julgamento sobre a trama golpista de 2022, Bolsonaro não hesita em aproveitar cada oportunidade para sustentar seu vitimismo, apresentar-se como um perseguido político de uma suposta ditadura do Judiciário e montar um circo contínuo para eletrizar a militância. Era esperado, portanto, que ele próprio transformasse a intimação em ato político. E assim o fez.
O inesperado, nesse caso, é que um ministro da Suprema Corte brasileira alimente um quiproquó que só interessa a Bolsonaro e seus aliados liberticidas que se utilizam da falsa ideia de uma ditadura do Judiciário para justificar seus atos indisfarçavelmente antidemocráticos. Não havia motivo aparente que impedisse o ministro Moraes de aguardar que o réu em questão recebesse alta do hospital para, enfim, intimá-lo.
Ocorre que, convicto de sua condição de plenipotenciário guarda-costas do Estado Democrático de Direito, o ministro Moraes não parece afeito a tais cuidados. Com seu modus operandi de modular as ações como se estivesse numa luta do “bem” contra o “mal” – sendo o “bem” obviamente representado por aqueles que prezam a democracia, liderados pelo STF –, o ministro reagiu de bate-pronto ao esforço palanqueiro de Bolsonaro. O ex-presidente havia concedido uma entrevista por vídeo a uma rede de TV e participado de uma live em que conversou com os três filhos e o ex-piloto Nelson Piquet. Ato contínuo, Moraes mandou intimá-lo.
Se observada a estrita letra da lei, segundo informa o artigo 244 do Código de Processo Civil, a citação só seria evitada em caso de doente em estado grave – o que não parece ser o caso de Bolsonaro, ainda que seu problema de saúde seja sério. Mas se observada outra lei, a do bom senso, o ministro Moraes teria feito um exame mais profundo das circunstâncias e das consequências da decisão. Preferiu, no entanto, a birra. Pior para a imagem do Supremo.